A gente vai se falando… Vamos combinar… e no final ninguém vai
A gente vai se falando… Vamos combinar… e no final ninguém vai. As dificuldades em levar público para os shows autorais é uma triste realidade a quem atua nessa área artística. Os entraves, mesmo quando pequenos estão sempre presentes, e podem, para os não perseverantes, destruírem carreiras promissoras.
Não se faz festa sem pessoas, e esse é talvez o maior empecilho para um evento de sucesso no underground (levar público). E quando há a promessa desse tal público ir, eles desistem em cima da hora. Por que?
Zygmunt Bauman falava sobre “amores líquidos” e a capacidade atual dos seres humanos em trocar qualquer coisa por outra melhor (qualquer coisa mesmo, inclusive pessoas, imagina um programa a noite…).
Artigos de psicanálise citam o período da infância, quando os pais mentiam para os filhos, prometendo algo e não cumprindo. Essas crianças crescem achando normal não manterem suas palavras.
Aqui vou apresentar outras questões de cunho econômico (sem tempo irmão…).
“A gente vai se falando”, “Vamos combinar”. Nem sempre essas frases apontam falta de responsabilidades a quem as emite. É bem mais provável que a causa esteja no âmbito capitalista. Em qual horário exatamente acaba o expediente no trabalho dessas pessoas? Eles são respeitados pelas empresas em que eles trabalham? Onde eles moram? É longe ou próximo do local do show? Há transporte noturno para a volta pra casa? Qual o valor dos ingressos? Qual o valor da consumação do local?
Saiba que é possível que frases desse tipo também sejam uma forma educada e codificada de dizer: “caso eu tenha dinheiro e tempo, e não esteja cansado do trabalho eu irei”. Ainda mais em se tratando da nossa cultura, em evitar falar abertamente certas coisas para “não ofender” ninguém, etc.
Como podemos, sendo artistas e produtores, burlar esse impedimento e criar meios e estratégias para fazer com que mais e mais indivíduos se façam presentes nos eventos? Não seria oportuno começarmos a estudar um pouco mais sobre economia, políticas públicas, leis, mobilidade pública e promover mudanças estruturais para resolver problemas nesse contexto? Aumentar a renda do povo, diminuir a carga horária do trabalho formal, ampliar o transporte público, etc. Já pensou o porquê, apenas os de renda mais alta “tem mais interesse” em livros, teatro, museus, espetáculos, etc? Será mesmo que só eles têm esse anseio por cultura e conhecimento ou será porque só eles tem as duas coisas mais importantes no sistema capitalista: tempo e dinheiro?