Saravá Metal no Orí!
COLUNISTA: CLAUDIO FURTADO
Certas manifestações culturais me impressionam. A banda de Rock Gangrena Gasosa é uma delas.
Acompanho a carreira dos caras desde quando eles começaram a tocar no Garage, no Rio, nos anos 90. São a única banda de Saravá Metal do planeta.
Na época havia uma grande polêmica sobre eles, pois eles pegavam as oferendas nas encruzilhadas, e depois durante os shows, as jogavam no público. Banho de pipoca e de farofa era uma constante, e a galera curtia toda essa zoação. Rolaram inclusive artigos falando de brigas de integrantes do grupo com religiosos que estavam putos por eles “roubarem” os despachos. Tudo isso chamou a atenção do mundo underground do Rio e faz parte da mitologia desta banda carioca.
Mas quando analisamos mais profundamente a proposta da banda, percebemos que a parada é bem mais complexa. Letras com críticas nos mais variados temas. Críticas sociais, religiosas, políticas e econômicas. Zoação do status quo, em geral. Filmes e bandas de rock da moda também não escapam das críticas do Gangrena. E tudo sempre envolvido na cultura da Umbanda, do Candomblé, da Quimbanda e do Folclore Brasileiro. Inclusive os integrantes da banda se caracterizam com vestimentas de entidades e de um orixá.
Eles já fizeram um tour na Alemanha. Isto foi mostrado no documentário da banda – Desagradável – o qual vale à pena assistir. Eu até havia pensado que seria legal se as canções deles tivessem sido traduzidas para o público alemão entender melhor o contexto de seu trabalho, mas cheguei à conclusão de que suas letras são intraduzíveis, pois são ambientadas num carioquês suburbano bem pesado, além de ter referências religiosas que também seriam difíceis de traduzir. Ou seja, é uma banda do underground que fala muito alto para quem tem raízes na Cidade Maravilhosa. Uma possível tradução de suas letras exigiria uma imensa quantidade de notas de rodapé, o que talvez fosse mais adequado para um trabalho acadêmico.
Realmente é muito difícil surfar na profundidade do Gangrena sem ter vivido a cena underground carioca. Lembro de uma vez ouvir dois jornalistas conversando sobre as letras do Bob Dylan, e de como era difícil interpretar as letras dele sem ter vivido a cultura americana onde ele estava inserido, pois mesmo sabendo o idioma inglês, era insuficiente para entender o contexto amplo e profundo das músicas do Bob. Coisa semelhante acontece com o Gangrena e com todos os artistas que se expressam fortemente através de suas raízes culturais. Somente os que vivem a realidade do artista conseguem entender o seu trabalho com profundidade.
É curioso também dizer que mesmo com toda a polêmica religiosa que rolava com relação ao “roubo” dos despachos, o falecido Fábio Costa – um dos fundadores do saudoso Garage Art Cult – relatou no documentário sobre o Gangrena, que religiosos de um centro espírita próximo ao Garage, viviam dizendo que as entidades ficavam inquietas nas seções do centro quando uma certa banda tocava neste templo do underground carioca. Ou seja, parece que as entidades curtiam o som dos caras independentemente da insatisfação de seus adoradores e provavelmente também davam uma passadinha no Garage para curtir o Saravá Metal.
Se você não curtir um rock pesado, zoador, cultural-religioso e antissistema, então nem comece a ouvir o Gangrena. Mas caso você curta Punk, Hardcore, Thrash e coisas do gênero – como eu – então coloca o som berrando e começa a ouvir o Gangrena.
PS:
Som berrando só até as 22 horas, heinnn!!!, senão pode dar merda para você!
🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣